terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Seu Belarmino e os livros

Acompanhe abaixo uma narrativa relacionada ao tema do post anterior.



Seu Belarmino fora professor de Português. Agora era livreiro. A tarefa de ensinar a língua pátria o deixara pessimista; mais encasmurrado ainda ficou como vendedor de livros.
– Serviço besta! – resmungava sempre entre dentes. Como raramente era perturbado por algum freguês, viva lendo. Lia tudo: romance, poesia, ficção científica, ciência, curiosidade, anedotas, passatempo, tudo.
A mulher de Seu Belarmino é que não aguentava mais a miséria doméstica. Fazia serviços de costura para a freguesia, vendia mercadorias de casa em casa, desdobrava-se para dar o comer e o vestir aos filhos
– Vendeu alguma coisa hoje, Belarmino:
Belarmino tirava dos bolsos algumas moedas e jogava sobre a mesa:
– Um garoto comprou dois livro didáticos. Foi só. Passei o dia todo...
– Já sei – emendava a mulher. – Passou o dia todo coçando o saco.
– Não senhora. Você sabe que estou escrevendo uma obra que nos vai deixar famosos... Ricos, não sei; mas famosos, com certeza.
– Que obra é essa, seu bobo sonhador?
– O título será: O futuro dos livros.
A mulher explodiu em gargalhadas:
– O futuro dos livros? Essa é boa! O futuro dos livros está esgotado. A tevê acabou com eles. Você percebe? Acabou com eles. Estamos na era da eletrônica, meu velho.
– Na era da eletrônica e da burrice – resmungou Belarmino.
– Que é que você disse?
– Nada, nada...
(Suzi Gonçalves, Laboratório de Redação)

ANDRÉ, Hildebrando A. de. Curso de redação.  5ª ed. São Paulo. Editora Moderna, 1998.

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